segunda-feira, 21 de julho de 2008

Cangaço e Mossoró: 80 anos da resistência e muitos anos de apropriação da História.



“Uma cidade se (re)faz com seus eventos e com as histórias que contam sobre eles”
(FONSECA, Ailton S. de Souza. Tempo, memória e cidade. In: Os Rosado em tese. Mossoró: Coleção Mossoroense, 2001).


“As 5 ½ , o grupo levantou acampamento rumo a Mossoró... marcharam uns 40, mais ou menos, para o ataque, comandados por ‘Lampião’, Sabino e Massilon e divididos em três grupos. Seria 16 ½ horas. O céu estava carregado de nuvens. Ameaçava chuva muita, ouvindo-se forte trovoada. E lá se foi o bando infame... Uns vinte minutos depois, começou, terrível, o tiroteio, acompanhado, a princípio, pela trovoada. A luta foi rápida.” Palavras registradas num diário que descreve o atípico 13 de Junho de 1927, em Mossoró. O autor, coronel Antônio Gurgel, era comerciante influente na sociedade potiguar da primeira metade do século XX - prisioneiro do bando do cangaceiro Lampião - suas anotações tornaram-se uma relevante fonte histórica para os interessados em conhecer um pouco mais sobre o fenômeno do Cangaço.
O que mais sabemos sobre a invasão do bando de Lampião à Mossoró? Como, em nossa cidade, tem sido rememorado este fato histórico? Qual o papel da prefeitura, especificamente, através de seus órgãos culturais, na construção de uma memória coletiva acerca da importância dos acontecimentos do 13 de Junho de 1927? Tais indagações permiti-nos apontar algumas considerações acerca da relação existente entre a resistência mossoroense ao Cangaço e a apropriação da História. Esta última refere-se à maneira pela qual o poder público municipal rememora o 13 de junho de 1927.
Em Mossoró, os acontecimentos alusivos à invasão do Cangaço à cidade, são retratados anualmente, com maior destaque, através do “Chuva de balas no país de Mossoró”, espetáculo teatral ao ar livre, realizado no adro da igreja de São Vicente, durante as festividades do “Mossoró cidade junina”. O espetáculo teatral, destacado pelo brilho e encanto produzidos pelo recurso áudio-visual empregado, tem sido muito mais um instrumento de formação de uma memória popular sem que haja, para o público, o espaço para o exercício de um pensamento crítico; impedindo, dessa forma, que o conhecimento histórico possa exercer um de seus mais relevantes objetivos: a formação cidadã dos indivíduos.
Já no período que antecede as festividades, a administração municipal, junta à divulgação do evento, um discurso que busca fazer valer a idéia de que existe uma consciência histórica dos munícipes, acerca do 13 de junho de 1927, consciência esta, de um heroísmo inato ao povo mossoroense, consolidada com a resistência ao bando de Lampião em ataque à Mossoró. Dessa forma, a administração municipal intervém de forma concreta, visando ritualizar o passado, desviando (a serviço dos grupos políticos dirigentes) a memória popular. Momento em que, é de grande relevância para o município, o uso das festividades para simular a existência de uma identidade heróica da população mossoroense.
Nesse sentido, os eventos desenvolvidos pela prefeitura, não exercem um papel de consolidação dos aspectos histórico-culturais significativos para a sociedade mossoroense, servindo muito mais como entretenimentos populares. A não valorização de iniciativas que, de fato, incentivem o desenvolvimento cultural local, evidencia-se na própria alocação de recursos financeiros para a programação geral do evento, onde o montante utilizado na contratação de bandas musicais de “sucesso” sobrepõe, e muito, o valor dos recursos alocados para ações como: seminários temáticos, exposição de livros, premiações de trabalhos literários, publicação de pesquisas, etc.
Portanto, a apropriação da história, se dá também pela não realização de ações que possibilitem o desenvolvimento de um conhecimento histórico, onde os mossoroenses contemporâneos possam sentir-se sujeitos ativos, analisando e não somente confirmando o que tem sido divulgado a partir dos interesses ideológicos do poder vigente. As possibilidades para a efetivação de uma “desapropriação da história” pelo poder municipal, são várias, a saber: ações no âmbito escolar municipal, como a realização de palestras, exibição de imagens, discussão de textos referentes ao acontecimento, despertando nos estudantes, o exercício de um olhar sobre a história de sua cidade, nas suas diversas leituras; promoção de encontros com professores e estudantes para analisarem as principais obras que se dedicaram à temática em estudo, possibilitando a formação de novos leitores, estimulando-os ao labor da pesquisa histórica; possibilitar ao cidadão mossoroense e visitantes, o conhecimento do contexto histórico do 13 de Junho de 1927 (os significados do cangaceirismo no Nordeste, o que levava estas pessoas tornarem-se membros do Cangaço, quais as ações executadas pelos cangaceiros, o porque da invasão à Mossoró, os aspectos sócio-econômico do Brasil na década de 1920 do século passado, etc), dentre muitas outras problemáticas que poderiam nortear esses encontros.
Entretanto, com vistas à consolidação e perpetuação do mando, o poder público municipal usa os acontecimentos históricos para, através de entretenimentos, sustentar no imaginário popular, uma imagem mítica das personalidades envolvidas na encenação, de maneira que, em torno desses mitos, a municipalidade justifica, ressignifica e legitima o poder político vigente.
Eventos como o “Mossoró cidade junina” e o espetáculo “Chuva de bala no país de Mossoró” não devem ser observados e divulgados de forma a enaltecer o poder político vigente, pois, sendo estes, momentos privilegiados de sociabilidade, formação e informação da opinião pública, configuram-se como mecanismos utilizados para a execução de um dado projeto ideológico. Como enfatiza o autor da epígrafe deste artigo, “demais, as palavras e os gestos compõem um conjunto simbólico na festa que, associada aos monumentos, às cores, às músicas, aos efeitos pirotécnicos perpetua a memória apropriada e difundida pelo grupo político dirigente, garantindo a eficiência do rito na sociedade” (FONSECA, 2001- p.186).
Portanto, a história pode cumprir um papel fundamental na sua relação com a perpetuação da memória e construção da identidade de um povo, na medida em que, as ações que visam tal objetivo, não sejam meros entretenimentos, e sim, como iniciativas permanentes, que fortaleçam o patrimônio histórico e cultural local.
(Artigo publicado na Revista Papangu, nº41, junho de 2007)
Charles Bronson
Professor

chbronson_1@yahoo.com.br

4 comentários:

Unknown disse...

nossa...
sei site é muito egal,fala de coisas interassantes...
valeu!

renato e ramon disse...

valeu pelo site prof



gostei mesmo





tchau ate logo

Matheus disse...

essa historia eu achei muito interessante parabens

José Dias disse...

Gostei muito da visão com que abordaste o tema (A invasã do Bando de Lampião a Mossoró). Acho que você está no caminho certo...

Valeu garoto,
Você tem potencial!!! Siga em frene...

Parabéns,

Lima Junior (limabiblos@yahoo.com.br)

Veja o blog (amantesdeclio.blogspot.com), que desenvolvo com meus alunos da E.M.G. M.